

Juventudes em Foco: Todo mundo quer ser jovem, mas quem quer cuidar dos jovens?
Em: 31/07/2025
Por: Eduardo Schmitz
Categorias: Vocacional Blog
Por: Tatiana Heiderscheid Ostroske, licenciada em Educação Física, pós-graduada em Gestão de Pessoas e estudante de Psicologia. Atualmente é Orientadora Pedagógica do Centro Educacional Dom Bosco, de Joinville/SC.
Vivemos um tempo curioso. Nunca se investiu tanto em parecer jovem — nos discursos, nas propagandas, nas redes sociais, nas roupas, nos procedimentos estéticos e até na forma de falar. A juventude tornou-se símbolo de liberdade, beleza e consumo. Mas há um contraste: enquanto muitos desejam continuar parecendo jovens, poucos se comprometem a acompanhar os próprios jovens nos desafios reais que enfrentam.

Essa juventude idealizada que a cultura vende — eterna, forte, bem resolvida — não é a mesma que encontramos nos nossos pátios, nas salas de aula, nas comunidades, nas famílias ou nas ruas. O jovem de verdade tem dúvidas, sonhos, dores e, muitas vezes, não encontra quem o escute. Quando brinca, dizem que já passou da idade. Quando quer opinar, dizem que ainda é cedo demais.
Como bem define o Estatuto da Juventude, são considerados jovens os sujeitos entre 15 e 29 anos de idade, um grupo plural, em fase de experimentações, decisões e aprendizados. Esse mesmo estatuto afirma que é dever do Estado, da sociedade e da família garantir que esses jovens sejam reconhecidos como sujeitos de direitos, com voz ativa, participação social, acesso à cultura, à educação, ao lazer e a uma vida digna.

Mas será que temos feito isso?
Cada vez mais, vemos adultos tentando parecer jovens, enquanto evitam assumir o papel de referência. A sociedade atual tem sido marcada por um fenômeno conhecido como “adolescência generalizada”, no qual o estilo de vida juvenil é exaltado como ideal para todas as idades. Nesse movimento, o lugar do adulto como presença ética, de escuta e de orientação vai se apagando. O resultado é um paradoxo evidente: muitos querem manter-se jovens, mas poucos se colocam como adultos disponíveis para acompanhar as juventudes em suas dúvidas, descobertas e enfrentamentos. Assim, os jovens acabam cercados de cobranças e expectativas, mas raramente contam com presenças que caminhem verdadeiramente ao seu lado.
Como nos alerta Michel Foucault em Vigiar e punir, as instituições modernas — como a escola, a família e o próprio sistema social — operam por meio de dispositivos de disciplina que regulam os corpos, os comportamentos e até os pensamentos. A juventude, nesse contexto, torna-se alvo de vigilância constante, de normalização dos seus modos de ser e de punibilidade de suas expressões. O que chamamos de desvios ou rebeldia muitas vezes são, na verdade, resistências legítimas a esse controle silencioso que busca enquadrar o jovem em uma lógica produtiva e obediente. Quando a escuta é substituída pelo enquadramento, deixamos de reconhecer o jovem como sujeito e passamos a tratá-lo como um problema a ser corrigido.

É nesse vazio de escuta e presença que o jovem se torna vulnerável. Quando não encontra acolhimento em casa, busca pertencimento em redes sociais, grupos virtuais ou outros espaços, muitas vezes inseguros. E o que, à primeira vista, parece rebeldia, muitas vezes é apenas um grito por atenção, cuidado e presença.
As juventudes têm seus direitos reconhecidos em lei, mas o desafio está em garantir que esses direitos não fiquem só no papel. É preciso que as políticas públicas sejam concretas, articuladas e construídas a partir da realidade e da diversidade juvenil.
Como destacam Érica Guerra e Maria do Carmo Cruz (2023), o atendimento integral ao jovem demanda intersetorialidade, ou seja, a colaboração real entre áreas como educação, cultura, saúde, trabalho, assistência e segurança. Sem isso, seguimos oferecendo respostas fragmentadas a problemas complexos.

Ao mesmo tempo, precisamos estar atentos às armadilhas do discurso vazio de protagonismo. Como alertam Sérgio Quadros e Nora Krawczyk (2024), muitas vezes a juventude é chamada a participar apenas para legitimar decisões já tomadas. Um protagonismo juvenil verdadeiro não se limita a ocupar espaços, mas pressupõe escuta, poder de decisão e condições reais para transformar a própria realidade. Quando isso não acontece, o que se produz é apenas uma adequação do jovem às demandas do mercado — e não o fortalecimento de sua autonomia como sujeito político e social.
Por isso, fica uma pergunta direta para todos nós: quem tem cuidado dos jovens em nossos espaços pastorais, sociais e educativos? Será que escutamos suas dúvidas? Acolhemos seus processos? Permitimos que tragam suas propostas e inquietações — ou ainda os tratamos como mão de obra voluntária ou futuros líderes, sempre num tempo que ainda não chegou?
Reconhecer a juventude como prioridade não é apenas tarefa do Estado, é uma missão compartilhada. Nossos espaços educativos, sociais, pastorais e comunitários também são territórios de disputa de sentidos: ou colaboramos com a formação crítica e cidadã dos jovens, ou seguimos apenas impondo padrões e expectativas que desconsideram sua realidade concreta.
A compreensão do ser humano como sujeito histórico, social e inacabado, tal como propõe Paulo Freire (1996), convida-nos a repensar o lugar da juventude nas políticas públicas e nas práticas cotidianas. Longe de serem receptores passivos de valores prontos, os jovens devem ser reconhecidos como protagonistas ativos de suas trajetórias, capazes de ler criticamente o mundo e transformá-lo. Essa perspectiva rompe com práticas autoritárias e aposta em processos coletivos de emancipação, nos quais escuta, participação e pertencimento não sejam apenas palavras bonitas nos discursos institucionais, mas experiências vividas no dia a dia.

Considerar a juventude como potência crítica e criadora é, antes de tudo, um chamado ético e político à construção de uma sociedade onde justiça e democracia sejam verdadeiras raízes. Que em cada canto onde atuamos, não restem apenas direitos escritos, mas se abram verdadeiros caminhos, vivos e possíveis. Pois construir com as juventudes é, sobretudo, semear as bases de um mundo mais justo, onde todos possam crescer em liberdade.
E é nessa construção que reafirmamos o compromisso fundamental com a dignidade da pessoa humana, valor essencial que sustenta todo o nosso trabalho e guia nossa missão de acompanhar e transformar a vida das juventudes.
Neste ano, o Observatório Salesiano de Juventudes está organizando a série de textos Juventudes em Foco. As publicações serão aqui no site da inspetoria. Serão pequenas reflexões sobre as realidades e culturas juvenis, em suas mais variadas expressões e desafios. Serão escritas por educadores, professores, gestores e colaboradores salesianos, que vão partilhar seu conhecimento e sua experiência de forma simples, com o objetivo de pensarmos juntos e juntas.
Acompanhe nossas próximas publicações, compartilhe com os educadores da sua obra, com as lideranças paroquiais, catequistas e todas as pessoas que, assim como nós, tem um coração salesiano.
Você também gostaria de participar escrevendo uma reflexão ou sugerindo temas? Escreve para a gente: observatoriosalesiano@dombosco.net
Referências
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 16 jul. 1990.
BRASIL. Estatuto da Juventude. Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 6 ago. 2013.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1987.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GUERRA, Érica; CRUZ, Maria do Carmo Brant de. Intersetorialidade nas políticas públicas de juventude: limites e desafios para a ação integrada. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 13, n. 2, p. 234–250, 2023. https://doi.org/10.5102/rbpp.v13i2.7890
QUADROS, Sérgio Luis de; KRAWCZYK, Nora. O protagonismo juvenil como estratégia de governo, gestão educacional e subjetivação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 45, e263533, 2024. https://doi.org/10.1590/ES.263533
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